A Cédula de Produto Rural e o Enquadramento como Crédito Rural: A Primazia da Finalidade Econômica

Bancos frequentemente utilizam a Cédula de Produto Rural (CPR) como um instrumento de financiamento, mas, em muitos casos, desvirtuam sua finalidade para contornar a rigorosa legislação do crédito rural. Essa prática, embora comum, prejudica os produtores ao privá-los de direitos e proteções essenciais. Este artigo propõe uma estratégia jurídica para advogados e produtores rurais, defendendo o enquadramento da CPR como crédito rural sempre que sua destinação for o fomento da atividade agropecuária, independentemente da nomenclatura formal. A finalidade econômica da operação deve prevalecer sobre a forma, garantindo a aplicação do microssistema protetivo do crédito rural.
O Sistema Nacional de Crédito Rural, instituído pela Lei nº 4.829/65, visa fomentar a produção agropecuária, garantindo condições especiais aos produtores. A essência do crédito rural não reside na nomenclatura formal do título, mas sim em sua destinação teleológica. Se os recursos obtidos via CPR são empregados no custeio da safra, aquisição de insumos, máquinas ou na comercialização da produção, configuram, de fato, um financiamento à atividade rural. O objeto contratual, quando claramente voltado ao fomento agropecuário, como a compra de sementes ou fertilizantes, é o que define sua natureza. O artigo 3º da referida Lei é claro ao dispor que o crédito rural se destina a atender às necessidades de custeio, investimento e comercialização, pilares da produção no campo.
A jurisprudência tem sido fundamental para consolidar essa tese. O Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT), por exemplo, tem reiteradamente reconhecido a prevalência da natureza do contrato sobre o nomen juris. Em decisões como o Agravo de Instrumento nº 1028529-58.2025.8.11.0000 e o Agravo de Instrumento nº 1020389-35.2025.8.11.0000, o TJMT aplicou o princípio da primazia da realidade. Este princípio estabelece que a verdade dos fatos deve prevalecer sobre a forma jurídica adotada pelas partes, especialmente quando há desvirtuamento da finalidade. Assim, se uma CPR-F (Cédula de Produto Rural Financeira) é utilizada para financiar a produção, ela deve ser tratada como crédito rural, atraindo o regime jurídico protetivo. A Súmula 298 do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reforça essa perspectiva ao afirmar que “o alongamento de dívida originada de crédito rural não constitui faculdade da instituição financeira, mas, sim, direito subjetivo do devedor, desde que preenchidos os requisitos legais”. Isso demonstra que o produtor tem direito a um tratamento diferenciado, que não pode ser suprimido pela mera escolha de um título de crédito.
Para advogados e produtores rurais, a estratégia reside em demonstrar a finalidade rural da CPR. É crucial: a) Analisar a destinação efetiva dos recursos no contrato, buscando evidências de que foram aplicados diretamente na atividade agropecuária. b) Verificar se há vinculação ao ciclo produtivo, seja para custeio, investimento ou comercialização da safra. c) Identificar garantias típicas do crédito rural, como penhor de safra ou hipoteca rural, que reforçam a natureza da operação.d) Documentar exaustivamente a natureza rural da operação, reunindo notas fiscais, comprovantes de despesas e planos de safra.Com essa fundamentação, é possível pleitear direitos como o alongamento de dívida, proteção contra execução imediata e suspensão de negativação. A Lei 4.829/65, a Súmula 298/STJ e a jurisprudência do TJMT são os pilares para sustentar a aplicação do regime de crédito rural, protegendo o produtor.
Em suma, a Cédula de Produto Rural, quando destinada ao fomento da atividade agropecuária, atrai todo o microssistema do crédito rural, com suas proteções e benefícios. É imperativo que produtores e advogados estejam atentos à finalidade real da operação, documentando-a adequadamente. Buscar assessoria jurídica especializada é o passo fundamental e estratégico para assegurar a defesa dos direitos do produtor rural e garantir a justiça nas relações financeiras do agronegócio.
Para mais informações e conteúdos relacionados, acompanhe nossos canais oficiais. Estamos à disposição para contribuir com soluções estratégicas, pautadas na ética, na transparência e na excelência profissional.
Alan Claudio Maran – OAB/PR 111.056
Agroleme:instagram.com/agrolemeconsultoria
Grupo Solvenza: instagram.com/grupo.solvenza




